segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Frio na Espinha: Olhe para aquela mulher na neblina

O blog do União adianta os primeiros parágrafos da próxima edição do Frio na Espinha. Você lê a história completa no sábado, quando começa a circular o Jornal União impresso. Mas só leia se conseguir andar sozinho, depois disso, por uma estrada enevoada no início da manhã.



Élvio passou os anos 70 com as mãos no guidão de uma moto. Jaqueta de couro azul com duas faixas vermelhas em cada ombro. Camiseta da banda Eagles, calçado nas botas impecavelmente pretas.  Aquela Honda CB 500, com o tanque dourado e detalhes em verde-musgo, era a coisa que mais amava na vida. Mais de uma namorada se queixou de ser trocada pela máquina.

Isso até uma madrugada de agosto de 1979, quando a densa névoa tornou uniforme a paisagem da Estrada do Caqui. Ali, pela primeira vez em seus 24 anos, Évio quase esqueceu da moto, das botas invocadas, do estilo rock’n’roll, até da jaqueta que o primo trouxe do Texas. De um dia para o outro, sua cabeça estava apenas na garota que surgiu feito uma sombra no meio da neblina.

Disposto a enfrentar qualquer desconforto em troca de manter o estilo, Évio pagava por confiar apenas na jaqueta para enfrentar o frio dos primeiros dias de agosto. O ar denso e embranquiçado parecia se insinuar pelas frestas no couro, gola e mangas da camiseta como se tivesse dedos entumecidos pela geada. O show de uma banda cover do Pink Floyd, num bar decadente de Curitiba, valeu o sofrimento? Tanto faz, pensava Évio, para quem a atitude rebelde – até com bandas ruins e metereologia – era uma meta, um autoconvencimento. 

(continua...)

Museu da Pessoa # 1: João, o Coveiro

Museu da Pessoa Campinense

A partir da edição 391, o Jornal União passou a publicar a coluna Museu da Pessoa’. A proposta é homenagear gente que, embora anonimamente, é fundamental para a vida cotidiana em Campina Grande do Sul. 
A iniciativa é inspirada no projeto ‘Museu da Pessoa do Tarumã”, desenvolvido pelo curso de Jornalismo da UniBrasil (Curitiba) e coordenado pelos professores Elaine Javorski, Maura Martins (idealizadora) e Victor Folquening.
 http://museudapessoadotaruma.wordpress.com 



João, O Coveiro

Por Daniel Zanella

João, cabelos brancos, dentes levemente amarelados e rosto corado de sol, assistiu Brasil x Paraguai, pelas quartas-de-final da Copa América. Não gostou do que viu. “Fui goleiro na minha mocidade. Sei como é. O batedor tem que driblar, observar o gol. Não pode bater de qualquer jeito.” Apesar do conhecimento de causa, João alega não ter muito tempo para futebol. Não torce por nenhum clube. “Só vejo a novela das nove... Mas não me lembro do nome agora”.
João Salvador Neto, mais conhecido como O Coveiro, trabalha há 14 anos no Cemitério Municipal de Campina Grande do Sul, das 8 às 5 e meia da tarde. Gosta. “É tranquilo e silencioso”. Concursado público como operário, nunca imaginou que trabalharia algum dia em cemitério. “Não tenho do que reclamar, não. Aprendi até a fazer massa pra lacrar as gavetas”.
O cemitério é grande e dá muito trabalho: é preciso conservá-lo, carpir onde o mato quer vicejar, varrer as folhas que encarpetam as calçadas, limpar os túmulos particulares, auxiliar os visitantes. Quando sobra um pouco de tempo, gosta de conversar e andar pelos corredores do cemitério. Ouve um pouco de música, de preferência sertaneja. Tem especial simpatia pela dupla Bruno & Marrone e pelo cantor Leonardo. Lê pouco, de vez em quando ‘aquele’ jornal da cidade.
João é casado, pai de quatro filhos – três moças e um rapaz – todos estudando. O filho trabalha em um material de construção. No Cemitério, tem um ajudante, o Seu Jorge, mais conhecido como O Outro Coveiro.